Cansadas de viverem sozinhas, de vez em quando as letras resolvem se misturar na cabeça de algumas pessoas e, juntas, formam palavras, que formam textos que, dependendo do momento e da imaginação de cada um, tornam-se contos, ensaios, críticas ou até mesmo incríveis historinhas infantis.
Daí, surgem misturas fantásticas para saciar a nossa fome de beleza e nos levar a um mundo encantado que só a nossa imaginação, unida à imaginação de quem escreve pode desvendar.

terça-feira, 11 de outubro de 2016

O DESAMOR NOS TEMPOS DE CÓLERA


“Coisa bem diferente teria sido a vida para ambos se tivessem sabido a tempo que era mais fácil contornar as grandes catástrofes matrimoniais do que as misérias minúsculas de cada dia. Mas se alguma coisa haviam aprendido juntos era que a sabedoria nos chega quando já não serve para nada”.


Ainda muito jovem, o telegrafista, violinista e poeta Gabriel Elígio Garcia se apaixonou por Luiza Márquez, mas o romance enfrentou a oposição do pai da moça, coronel Nicolas, que tentou impedir o casamento enviando a filha ao interior numa viagem de um ano. Para manter seu amor, Gabriel montou, com a ajuda de amigos telegrafistas, uma rede de comunicação que alcançava Luiza onde ela estivesse. Essa é a história real dos pais de Gabriel García Márquez e foi ponto de partida de 'O amor nos tempos do cólera', que acompanha a paixão do telegrafista, violinista e poeta Florentino Ariza por Fermina Daza. Um amor que resistiu ao casamento de Fermina com outro e que esperou por um final feliz por 51 anos.

Mas, o amor sobre o qual pretendo falar aqui, não é o mesmo dos pais de Gabo ou de suas personagens no livro. Também a cólera é outra, é a raiva, a ira, que tem alimentado o ódio que proliferou no país.

Quero falar do amor fraterno, que une não apenas duas pessoas romanticamente, mas que pode unir tantas quantas puder alcançar, em uma relação de amizade e que, como o amor do livro, poderia durar cinquenta, sessenta anos e até mesmo seguir mais e mais em frente, deixando suas sementes milênios no ar.

Quero falar desse amor que está sendo vencido pela cólera. Uma cólera que não é enfrentada, contornada, sequer desafiada e que, ao contrário, está ganhando e enfraquecendo sentimentos e amizades.
Sim, vivemos amores e desamores em tempos de cólera.

E, nesses tempos, em que telegramas foram substituídos por whatsapp e telegram, cartas por e-mails e álbuns de fotos e conversas entre amigos e familiares foram substituídos pelo Facebook, os amores deveriam estar se reforçando, se alimentado e se fortalecendo.

Mas, infelizmente, as redes sociais, como tudo nessa vida, têm dois lados. Um lado que aproxima e outro, cruel, que afasta.

Protegidos pela invisibilidade, pela incapacidade das outras pessoas poderem lhes olhar olho no olho, as pessoas tomam ar e digitam tudo o que, pessoalmente, não teriam coragem de dizer, seja de bom, seja de ruim. E os ataques vão acontecendo, cotidianamente, ferindo sentimentos, matando amizades, por vezes espalhando boatos que prejudicam a moral ou a vida profissional dos outros.


Perfis falsos são criados só para xingar, denegrir, ofender, destratar, humilhar. Postagens são criadas com o único intuito de magoar. E, enquanto isso, os alicerces que uniam amigos e famílias, vão se desintegrando.

E, o tempo passa tão rápido que, um dia, de repente, a gente se lembra daquele amigo, daquela amiga, que já não vemos há tempo, que sequer temos falado nas redes e percebe, com muita tristeza, que o amor, a amizade, não está resistindo aos tempos de cólera.

Se antes o que unia as pessoas eram os sentimentos, hoje eles não são mais suficientes para que amizades perdurem. Hoje, o fator dominante para manter as amizades é a opção política. Amigos inseparáveis antigamente, hoje mal se falam. Famílias excluem membros dos chats por expressarem opinião diferente da maioria do grupo. Até mesmo a cor da roupa que a pessoa usa pode provocar xingamentos e humilhações na rua.


E daí fico me perguntando se os pais de Garbo vivessem hoje a sua história, aqui no Brasil e cada um tivesse uma opinião política diferente, o amor que resistiu às proibições, à distância e ao casamento com outras pessoas, resistiria à divergência política? Esperaria anos e anos no ar?

Chico inicia sua belíssima música Futuros Amantes assim: “Não se afobe não que nada é pra já, o amor não tem pressa, ele pode esperar, em silencio, no fundo do armário, na posta restante, milênios, milênios no ar” e termina: “Não se afobe, não, Que nada é pra já, Amores serão sempre amáveis, Futuros amantes, quiçá Se amarão sem saber, Com o amor que eu um dia Deixei pra você”.

E daí, ouvindo a música fiquei pensando se, com tanto ódio, tanta amargura, solta no ar, como se amarão os futuros amantes? Acredito que temos a responsabilidade de deixar muito amor no ar para que ele se espalhe e nunca se acabe. Para que ele permaneça milênios no ar.

Por isso quero meus amigos de volta, quero poder me encontrar com todos os amigos e amigas que tanto quero bem, sem que os lados opostos na política coloquem um paredão entre nós. Quero ouvir o telefone tocar e falar com amigos que não me ligam há muito tempo. Quero poder me encontrar com as pessoas queridas como nos velhos tempos, antes do tempo da falta de amor em tempos de cólera.

Mais tolerância e menos irritação! Mais solidariedade e menos amargura! Mais carinho e menos guerras! Mais amor e menos cólera.


segunda-feira, 3 de outubro de 2016

LAVANDO A ALMA


O Recife amanheceu com suas ruas molhadas, como se as nuvens quisessem lavar a cidade, depois de uma eleição difícil e sofrida para os que votaram, realmente, de  acordo com a  sua opção política, seja de esquerda ou de direita e não movidos pelo ódio e pela alienação política.

As águas da chuva que começaram a cair ontem à noite pareciam querer limpar a cidade, da sujeira deixada pelo material de campanha espalhado em torno dos locais de votação e também as consciências dos que votaram em nome do ódio e não da cidade.

Em todo o país tivemos uma eleição movida por um ódio insano, cujo único objetivo era impedir que o Partido dos Trabalhadores elegesse seus candidatos. E não o que fosse melhor para a cidade.

Aqui no Recife não foi diferente. Como pode uma administração apática, insípida, que não tem nada de importante a apresentar, que não fez nada para melhorar a qualidade de vida da população, quase ter sido reeleita em primeiro turno?

Eram oito candidatos. Claro que a maioria não tinha real probabilidade de eleição. Na verdade, podemos dizer que três tinham. E, por isso mesmo, não se admite que a eleição quase tenha sido decidida no primeiro turno.

O ódio ao PT tem cegado as pessoas e as impedido de enxergar além de seu próprio umbigo.  Um ódio direcionado contra um Partido, camuflado de combate à corrupção, quando em praticamente todos os partidos existem denúncias, delações de parlamentares corruptos, mas que permanecem blindados pelo simples fato de que não foram eles que proporcionaram a oportunidade aos pobres de uma ascensão na escala social, que os fez chegar mais próximo de uma classe econômica abastada e egoísta, que não quer dividir com eles os espaços nos aviões, nos shoppings da vida ou nas salas de espera dos laboratórios e consultórios médicos.

Eleitores de Priscila Krause e de Daniel Coelho, ao ver que, nas pesquisas, João Paulo continuava em segundo lugar, mudaram seu voto para Geraldo Júlio para garantir que João Paulo não fosse eleito, não importando que, assim, estavam prejudicando seus próprios candidatos, praticando o chamado “VOTO ÚTIL”.

Votar a favor de um porque não se quer que outro se eleja é uma prova da despolitização gigantesca que se espalha pelo Brasil feito rastilho de pólvora. E, todos nós sabemos o que acontece quando o rastilho é consumido: uma inevitável explosão.

Se a atual administração estivesse sendo positiva, se a cidade do Recife houvesse melhorado, então a recondução do atual prefeito seria justificada. Mas, se apropriar de obras de governos anteriores e dizer que são suas, não torna isso verdade. Criar uma ciclo-faixa de lazer, aos domingos e feriados, não é melhorar a mobilidade na cidade. Embelezar a orla de Boa Viagem, construindo uma academia de Pilates em um dos jardins da avenida, não é melhorar a saúde dos recifenses. E inaugurar um parque não é ter como prioridade a preservação do meio ambiente.

Insegurança crescente, com a ocorrência de estupros que colocam as mulheres em uma situação ainda mais vulnerável e o aumento de assaltos, inclusive a ônibus, iluminação precária em muitas partes da cidade, trânsito caótico e ruas praticamente intransitáveis nos bairros, com estacionamentos e mão dupla que deveriam ser revistos, calçadas sem condições de uso por pessoas com dificuldade de locomoção, tudo isso sem falar nos problemas dos bairros mais afastados e menos favorecidos economicamente, são o relatório vivo de uma administração que não fez praticamente nada pelo povo da cidade, sobretudo pelos que mais precisam. E, mesmo assim, quase ganha no primeiro turno. Que justificativas encontramos para esse fenômeno?

Não conheço ninguém que esteja satisfeita com o atual prefeito. Porém, na hora de mudar isso através da legitimidade do voto, as pessoas preferem endossar uma administração incompetente a arriscar uma nova, como seria o caso de Daniel Coelho ou Priscila, desde que o PT não seja eleito. Quem perde? Os candidatos que não chegaram ao segundo turno? O PT que chegou por um fio? Ou a cidade do Recife que continua sob o risco da continuidade do descaso com a sua população? Ao quase levar o atual prefeito a uma vitória no primeiro turno, não foi dado um NÃO a Daniel, Priscila, Edilson ou João Paulo ou aos outros quatro candidatos. Foi dado um NÃO ao futuro do Recife.

O segundo turno não é fruto do acaso. É fruto da persistência, da perseverança dos que acreditam no Recife e querem que a cidade seja melhor administrada.

É uma segunda chance, uma nova oportunidade de mudar o que está aí. Novas alianças serão feitas, novas negociações, novos apoios. Se você acredita que a nossa cidade merece uma nova chance, no dia 30 de outubro vote então a favor da cidade.


O Recife merece ser uma cidade melhor. Pense nisso. No segundo turno dê uma chance ao Recife. Não vote em nome do ódio, vote em nome do amor.