Cansadas de viverem sozinhas, de vez em quando as letras resolvem se misturar na cabeça de algumas pessoas e, juntas, formam palavras, que formam textos que, dependendo do momento e da imaginação de cada um, tornam-se contos, ensaios, críticas ou até mesmo incríveis historinhas infantis.
Daí, surgem misturas fantásticas para saciar a nossa fome de beleza e nos levar a um mundo encantado que só a nossa imaginação, unida à imaginação de quem escreve pode desvendar.

domingo, 23 de outubro de 2011

NA MORADA DAS PALAVRAS

Ler é uma prática que provoca as mais diversas reações. Enquanto para uns é um verdadeiro prazer, um deleite, para outros é algo tão ruim que o mais fino dos livros se torna uma enciclopédia de 500 volumes.
Eu, particularmente, adoro ler. Comecei ainda muito cedo, quando, alfabetizada, devora os livros de história que ganhava de presente ou herdava de minha irmã mais velha.
Cresci em uma casa onde meus pais gostavam de suas coisas que considero essenciais em minha vida: música e leitura.
Na pré-adolescência, li até as famosas e bregas fotonovelas.
Na escola, além dos livros obrigatórios da literatura brasileira, era freqüentadora assídua da biblioteca, de onde sempre estava retirando livros.
Estou relendo, com muito prazer, “Na Morada das Palavras”, de Rubem Braga, de quem sou fã há muito tempo. Desde o dia que minha filha mais velha chegou em casa e leu, entusiasmadamente para mim, a crônica O PADEIRO, que havia recebido na escola, na aula de literatura.
Este texto, até hoje, figura entre os meus preferidos. Sou meio inclinada a gostar de textos que nos levem a repensar nossos conceitos, sobretudo quando, como em “O Padeiro”, recebemos uma lição de serena humildade.
Falecido há mais de 20 anos (1990), Rubem Braga nos deixou crônicas belas e, ao mesmo tempo profundas.
Na Morada das Palavras vamos nos envolvendo, a cada página, com um universo de alegrias, tristezas e encantamento, que deixa uma gostinho de “quero mais”, a cada final.
Leitura é isso: um passeio por um universo que, pode até ser bem diferente do nosso, mas do qual vamos conseguir formar imagens, construindo cada detalhe em nossa imaginação.
Certa vez, quando minha filha do meio tinha uns dez, doze anos, estava lendo um livro e uma colega perguntou se era passado pela escola. Daí a amiga bem espantada, perguntou: “você está lendo de propósito?”
Pois é, talvez, exatamente por não estar acostumada a “ler de propósito”, a coleguinha de minha filha não soubesse empregar bem as palavras de sua própria língua. Saberá hoje?
Minhas três filhas também cresceram em meio à música e aos livros. Meu marido também gosta das duas coisas.
Somos, portanto, uma família musical, que curte da música clássica ao heavy metal, passando pela bossa nova, MPB e Rock mais leve, como os Beatles.
Estes são alguns dos pequenos prazeres da vida, que, ainda que simples, transformam em agradáveis momento que poderiam ser o mais puro tédio.

domingo, 9 de outubro de 2011

MEMÓRIAS DE UMA TESTEMUNHA OCULAR

No sábado, 1º de outubro, tive um grande dia. Sabe um daqueles dias em que tudo é bom? Comecei o sábado revendo três queridas amigas – Leda, Goretti e Jovem – e, juntas, fomos assistir a uma palestra de outro querido amigo, Leonardo Boff. E, reencontrei Márcia, amiga também muito querida há quem não via há bastante tempo.
Reencontrar quem se gosta é sempre muito muito gostoso. A palestra, como não poderia deixar de ser, foi maravilhosa. Rever Leonardo e Márcia é sempre uma grande alegria.
À noite, fomos ao lançamento do livro de Pe. Marcelo Barros – Dom Helder – Profeta para os nossos dias – uma releitura do livro lançado há 08 anos. Eu e Marcelo nos conhecemos há muitos anos, quando eu fazia parte do grupo SOS, um grupo de jovens e adolescentes que se reunia no Colégio Salesiano, tendo como orientador o saudoso Pe. Ivan Teófiço. À época, Marcelo era o responsável pela Pastoral da Juventude da Arquidiocese de Olinda e Recife e Dom Helder Câmara era o arcebispo. O reencontro foi muito gostoso, conversamos bastante e nos prometemos nos ver com mais frequência.
E, foi exatamente por causa do livro de Marcelo que me veio à memória momentos privilegiados em que pude presenciar grandes encontros ou reencontros.
O ano foi 1999, onde pude presenciar estes momentos de rara beleza e emoção. Começo pelo mês de janeiro. Eu tive, e aqui repito a palavra, o privilégio, de fazer parte da comissão que estava organizando a comemoração dos 90 anos de Dom Helder. Estávamos organizando um vídeo, com depoimentos que vinham de todas as partes do mundo. E também gravávamos vários aqui mesmo. E, foi por causa de uma dessas gravações que vivi dois momentos únicos. O primeiro foi ter a alegria de conhecer, pessoalmente, Leonardo Boff e Márcia Miranda. Quem não conhece a sensação de apertar a mão de alguém que se admira muito, há muito tempo? E, o segundo momento, que guardo até hoje na memória, com detalhes, foi presenciar o reencontro de Leonardo Boff com Dom Helder. Vocês não podem avaliar a emoção de ver Leonardo ajoelhar-se diante de seu mestre e pedir-lhe a bênção. Confesso que as lágrimas escorriam de emoção. Dom Helder, afagou a cabeça de Leonardo e fez um gesto para que se levantasse. E ficaram ali, conversando baixinho, como a trocar memórias e confidências. Para mim era o encontro de dois mestres, dois titãs, de podemos chamar assim, da teologia e da vida cristã, se encontrando e me permitindo presenciar o momento.
Em 16 de julho participei de um reencontro diferente, articulado por mim e por Frei Betto: Chico Buarque de Dom Helder. Foi mais um daqueles momentos únicos na vida da gente. Registrado em vídeo e fotos, é uma daquelas ocasiões em que a gente fecha os olhos e revive cada segundo. Como poderei esquecer Chico cantando a Banda e Dom Helder acompanhando com as mãos? Foi o momento para qual escrevi um texto chamado “O Encontro dos Dons”, que se encontra publicado no site de Chico.
E, no comecinho do mês de agosto, novamente sou testemunha de grandes reencontros. Quando da realização da II Jornada Teológica Dom Helder Camara, tivemos a abençoada ideia de levar os palestrantes para visitar Dom Helder. Parecia que adivinhamos que, dali a duas semanas, o Dom partiria e, aquelas pessoas que levamos para vê-lo, teriam a sua derradeira oportunidade de estar com ele.
E, novamente, presencio o reencontro de Leonardo Boff e também de Dom Gílio Felício, então bispo auxiliar de Salvador, com Dom Helder, tendo ainda o bônus de participar de uma pequena e simples celebração eucarística, tendo como celebrantes o próprio Dom, Dom Gílio e Pe. João Pubben.
No dia seguinte, volto à casa de Dom Helder, para acompanhar Dom Waldyr Calheiros, então bispo de Volta Redonda, companheiro de tantas lutas de Dom Helder. Alegre e cheio de energia, Dom Waldyr não escondia sua alegria em rever o amigo.
No dia seguinte, encontro meu querido amigo Marcelo Barros, sentado na pequena escada da igrejinha das Fronteiras, para o encontro do com o Dom. Este encontro deu origem ao livro relançado por Marcelo e que me despertou estas memórias. O interessante é que, embora já um tanto ausente, em cada encontro destes, Dom Helder se mostrou presente, fazendo comentários que impressionaram os que o visitaram. A Marcelo ele disse:”Não deixe cair a profecia”, reconhecendo o discípulo e lhe pedindo para levar adiante a semeadura da Palavra. Marcelo descreve o encontro, em seu livro, com tanta propriedade, que me remeteu àquele momento e me fez agradecer novamente a Deus a oportunidade de vivê-los.
E, na sexta-feira, foi a vez de acompanhar Frei Betto no reencontro com seu grande mentor e responsável pela descoberta de sua vocação. Outro reencontro emocionantes, envolto em momentos de ternura, carinho e devoção. A Frei Betto o Dom perguntou pela saúde do “sobrinho” Dom Paulo Evaristo, que estava com um grave problema de saúde, demonstrando que embora não parecesse, ele estava atento.
Foram momentos incomensuráveis, daqueles que a gente nunca vai esquecer e que jamais se repetirão. São memória guardadas com muito cuidado, muito carinho, em uma gaveta especial da memória, onde a gente coloca saches perfumados imaginários, para que permaneçam sempre frescas e vivas. E ainda colocamos uma etiqueta com letras garrafais: PARA LEMBRAR SEMPRE.
Hoje, 12 anos depois, quando todas estas memórias saíram da sua gavetinha e povoaram vividamente minhas lembranças, conversando com meu marido, que esteve presente a todos estes momentos, foi que concluí o quanto sou privilegiada por ter tido estas oportunidades. Em alguns destes momentos havia outras pessoas presentes. Mas eu estive em todos eles, como testemunha silenciosa, que apenas valorizava e saboreava a oportunidade que lhe caia nas mãos.
Se, para cada um deles, o derradeiro reencontro com o Dom foi da maior importância, para mim, foi um presente. Um presente que nunca vai acabar e o qual posso rever, curtir, reviver, sempre que quiser. É só abrir a minha pequena e especial gavetinha.