Cansadas de viverem sozinhas, de vez em quando as letras resolvem se misturar na cabeça de algumas pessoas e, juntas, formam palavras, que formam textos que, dependendo do momento e da imaginação de cada um, tornam-se contos, ensaios, críticas ou até mesmo incríveis historinhas infantis.
Daí, surgem misturas fantásticas para saciar a nossa fome de beleza e nos levar a um mundo encantado que só a nossa imaginação, unida à imaginação de quem escreve pode desvendar.

sexta-feira, 13 de setembro de 2013

A CAMINHO DO PRIMEIRO MUNDO?



 Sempre que leio  ou ouço alguma coisa sobre o Brasil estar se preparando para ser do primeiro mundo,  eu me questiono sobre todo esse conceito. Há a preocupação com "tecnologia de primeiro mundo", "carro de primeiro mundo" etc etc. 

Mas será que para ser um "país de primeiro mundo", bastaria ao Brasil ser desenvolvido econômica e tecnologicamente ? Ou ser um "país de primeiro  mundo" vai muito além disto?

Moro em um prédio espremido entre um colégio e um enorme edifício que praticamente "abraça o meu. Durante o dia, o colégio faz um barulho tão grande, que me questiono com relação à aprendizagem dos alunos do lá. O colégio que é  de tamanho digamos assim de médio a pequeno porte, mas com mania de grandeza, para qualquer aviso, ensaio ou similares, usa  em sua quadra (colada ao muro do meu prédio) um sistema de som, que acreditem, seria adequado ao Geraldão. Para o tamanho da quadra, nem seria preciso microfone para dar avisos.

Quando têm festas então, é o começo do caos. As caixas de som são tão potentes, que as janelas dos quartos vibram, quando começam a tocar. Nesses dias, não se pode ouvir uma música, uma TV, até conversar fica difícil, em nosso prédio. Para dormir então, é impossível, mesmo com todo o apartamento fechado e ar condicionado ligado.  Graças a Deus, as festas noturnas não são todos os dias, como o são  o recreio e jogos.

Mas, quando não há festas e o colégio finalmente silencia, começa o turno do prédio vizinho, onde crianças e adolescentes ligam o seu som e se deleitam ouvindo o que há de mais irritante e de mau gosto na música da atualidade. Seus pais, com certeza, do outro lado do prédio, descansam tranqüilamente, assistem à sua TV sem serem perturbados, enquanto nós,  os vizinhos, que temos o "privilégio" de nossas salas serem ao lado da piscina deles, para conversarmos ou assistirmos ao jornal, temos que nos trancar no quarto. Isso se tivermos sorte e a criançada não estiver correndo em bando e gritando como loucas, na parte do prédio delas  que se avizinha aos quartos do nosso.

Dia desses, depois das 22h., enquanto eu tentava dormir com toda a gritaria que vinha do lado de fora, fiquei pensando nessa história de primeiro mundo. Para mim, isso vai realmente muito além. Envolve cultura e educação do povo. Uma educação que o povo brasileiro está ainda muito longe de ter.

Quando falo em educação, não me restrinjo à educação escolar que sabemos, é capenga. Da mesma forma que se aspira ao primeiro mundo, deixando-se de lado a miséria que assola o país, deixa-se também de lado os conceitos básicos de respeito e cidadania.

Cada vez que alguém pára em um sinal vermelho, mesmo que do outro lado não venha nenhum carro, está agindo com respeito às leis e exercendo a sua cidadania. Mas, atrás desta pessoa, sempre haverá alguém impaciente, buzinando no primeiro segundo em que o sinal vai abrindo. Se o sinal está aberto e paramos para não fechar o cruzamento,  para muitos, quem parou é "idiota" porque está atrapalhando a vida dos outros. É a tal famigerada "Lei de Gérson", que impinge a quem cumpre a lei a marca de "babaca" e a quem a burla sem punição, a marca "gloriosa" da esperteza.

O futuro será diferente de hoje? Quem ensinará às crianças e adolescentes de hoje a ter respeito por seus semelhantes, se nem nos colégios, nem em muitas casas elas estão aprendendo isso? Um colégio que ignora os apelos dos vizinhos e continua fazendo seu barulho à vontade, está mostrando o que aos seus alunos? Que a liberdade deles nunca terminará, não importa onde começa a do outro. E em casa, pelo visto, o conceito é o mesmo. Se as crianças querem se divertir, mesmo que incomodando os vizinhos, ninguém tem nada a ver com isso. Afinal, para onde foi o velho ditado “os incomodados que se mudem”?

É claro que estou generalizando e que existem raríssimas exceções, onde escolas ensinam aos seus alunos a serem realmente cidadãos. E há algumas poucas famílias que também têm essa preocupação com relação aos filhos.

Mas quando soube que em Viena, nos prédios durante a noite não permitido dar descarga no banheiro, para não incomodar os vizinhos, confesso que cheguei a achar até engraçada essa minha pretensão de nós, brasileiros, um dia fazermos parte de um grupo de pessoas, aonde o respeito ao outro chega a este nível de precaução.

É lamentável que, a maioria da população brasileira viva como se não existisse ninguém do lado, preocupados apenas como "o próprio umbigo".  E nessa perspectiva de centro do universo, vai-se fazendo ultrapassagens perigosas, virando-se à esquerda em locais proibidos, avançando-se sinais, fechando-se cruzamentos, furando filas, fumando em locais fechados e fazendo-se cada vez mais barulho, obrigando o mundo a conviver com o que se gosta,  e que na maioria das vezes é de gosto duvidoso. Por que, afinal de contas, uma boa educação doméstica, invariavelmente, está ligada a um bom gosto, logo, quem ouve boa música, só a compartilhará com os vizinhos, se estes estiverem em sua casa, jamais na casa deles, por tabela.

Para a maior parte dos brasileiros, para chegar à cidadania, falta ainda emprego, comida, saúde e educação escolar.

Mas para quem tem tudo isso, o caminho poderia estar bem mais perto. Mas, infelizmente, essa ainda não é a nossa realidade. Estamos vivendo uma era desastrosa para o nosso país, em meio a tantas revelações desagradáveis, tanta corrupção, com tantos jovens que votaram pela primeira vez sem o menor estímulo, e que olham, assustados, para o futuro do país, sem esperar grandes melhorias. Que bom seria que surgissem pessoas dispostas a investir nesse atalho esquecido, no caminho para o primeiro mundo: o do respeito por si mesmo e por seus semelhantes.