Se um tem o Dom do Amor, da Paz e da Vida, o outro tem o Dom da poesia, da música, da alegria.
Se um defendeu o direito à vida e à liberdade, levando aos quatro cantos do mundo a denúncia em favor dos fracos e oprimidos, o outro denunciou, levando a sua música.
Cada um dos dois, a seu modo, vem lutando para que o nosso país possa se tornar um lugar melhor, onde todos possam se sentir incluídos e partes integrantes da mesma nação, com direitos e deveres iguais para todos.
E foi assim que, no dia 16 de julho, dia da padroeira do Recife, Nossa Senhora do Carmo, em um final de tarde claro, com restos de sol, a música, as letras, a poesia, os dons, enfim, se reencontraram, para celebrarem a alegria de estar juntos.
O Dom mais velho, mais experiente, e por isso mesmo mais cansado, aguardava em sua cadeira de balanço, a chegado do outro dom, mais jovem, menos experiente até, mas trazendo consigo também a sua bagagem de luta pela libertação de seu povo, de seu país.
Os velhos e alegres olhos castanhos do profeta/poeta/escritor/pastor, encontraram os olhos azuis saltitantes do poeta/músico/cantor e por que não dizer também pastor, quando conduz com sua música, ao deleite e também à reflexão.
Dom Helder Camara, simplesmente o DOM.
Chico Buarque de Holanda, simplesmente o Chico.
Um, genial em seu pastoreio, outro, genial em suas criações.
Articulado por mim e por Frei Betto, o encontro dos dons foi um momento de ternura, ou de "fraternura"(como costuma dizer, carinhosamente, nosso irmão Leonardo Boff), visível nos rostos presentes.
De repente, o artista se levanta e cantarola trechos de "A Banda" para o profeta, que erguendo os braços alegremente, acompanha o ritmo da música, como se regesse uma orquestra: " Estava à toa na vida o meu amor me chamou, pra ver a Banda passar, cantando coisas de amor. A minha gente sofrida, despediu-se da dor, pra ver a Banda passar, cantando coisas de amor".
Com certeza, a luta do profeta e do compositor tem sido para que realmente a sua gente sofrida se despeça da dor. Não apenas para ver a Banda passar. Mas para viver num país onde a dignidade e a solidariedade sejam um princípio e não apenas uma referência.
Mas um profeta não se cala. Suas palavras, suas denúncias atravessam o tempo.
A um cantor também, não se consegue calar. Como a denúncia do profeta, sua música ficará milênios, milênios no ar. Talvez os sábios em vão tentem decifrar o eco de antigas palavras, fragmentos de cartas, poemas, vestígios de estranhas civilizações.
Mas, com certeza, os amores serão sempre amáveis, e futuros lutadores quiçá, erguerão suas bandeiras de luta em defesa da vida, embalados, talvez sem saber, pelos poemas e pelas canções que um dia, o profeta e compositor, deixou para eles.
Por isso, como diz o artista, "Não se afobe não, que nada é pra já". E como diz o profeta: - "Não devemos temer a utopia. Gosto de repetir muitas vezes que, ao sonharmos sozinhos, limitamo-nos ao sonho. Quando sonhamos em grupo, alcançamos imediatamente a realidade. A utopia, compartilhada com milhares, é o esteio da História".
Juntemos pois os nossos sonhos, pois só assim poderemos entender porque "O segredo de ser sempre jovem – mesmo quando os anos passam, deixando marcas no corpo- é ter uma causa a que dedicar a vida." ( Dom Helder)
Fotos: Sérgio Lobo
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